Com a ameaça do Sr. Angelo ainda ecoando, pensei em dizer a Dona Odila que não me sentia segura para dirigir, principalmente o carro dela (ela dizia que o carro era dela e ele dizia ser dele).
Fiquei alguns segundos sem saber o que fazer, mas não deixaria minha insegurança vencer e resolvi ir falar com ela.
Expliquei que não estava ainda confiante para dirigir sozinha, mas que certamente com o Sr. Angelo junto, iria ficar ainda mais difícil.
Ela rapidamente tirou o avental e pegou a chave do carro dizendo que iria comigo, mas que eu iria dirigir.
Depois de um grande stress e gritaria entre alguns palavrões, o Sr. Angelo viu que não adiantava discutir com ela e aceitou o fato de não ir conosco.
Avisei a Ana Maria, peguei a bolsa com os documentos e tremendo cheguei até o carro.
A Dona Odila me entregou a chave e encaminhou-se para a porta do passageiro.
Com dificuldade, abri a porta e me sentei no lugar do motorista.
Ela procurou me tranquilizar dizendo para me acalmar, arrumar os espelhos e o banco, de maneira que ficasse confortável.
Pensei que nada me faria ficar confortável, já que pra mim a situação era terrivelmente desconfortável, partindo do princípio que só na terceira tentativa consegui ligar.
Quando fui sair, olhei para o portão da fabrica e vi o Sr. Angelo com as mãos para trás (como era costume dele) e me encarando.
Deixei o carro morrer e ele fez um gesto com a mão sobre a garganta, gesto esse que significava navalha, era como chamavam os motoristas ruins.
A Dona Odila me acalmou e assim consegui sair aos trancos.
Tremendo e suando consegui chegar na tecelagem que ficava na mooca, perto do moinho São Jorge ou seja, muito perto, mas me pareceu longe demais.
Eu estava acostumada a ir até lá, mas dirigindo parecia que estava indo a outro pais.
Compras feitas e colocadas no carro, agora é só voltar.
Lembrei do Sr. Angelo e quase pedi a Dona Odila para dirigir na volta, mas ao pensar no que significava para mim essa atitude, ergui a cabeça, coloquei a coluna reta e entrei no carro.
A volta foi mais tranquila e quando terminei de descarregar as compras, tranquei o carro e devolvi a chave nas mãos do Sr. Angelo olhando fundo em seus olhos, sem nada dizer.
Ele não sabia e nunca saberia que foi responsável por uma vitória sobre mim mesma…