Entre trabalhos e brincadeiras, nossa vida em família passava por um período muito bom. Minha mãe nos ensinou a sermos unidos, o que aprendemos bem, quando um precisava de ajuda, os outros estavam sempre prontos a auxiliar.
A Nenem teria que voltar a Marília para continuar os estudos, já que em Rancho Alegre não tinha o grau em que ela estava, assim eu voltei para a casa da Florisa, enquanto a Nenem retornava a casa de minha mãe.
O Rolando me matriculou na única escola que havia na cidade. Ele se preocupava porque em função de muitas mudanças, eu estava atrasada nos estudos, apesar de que mesmo nos períodos de afastamento da escola eu sempre procurava estudar sozinha.
Certa vez, um amigo do Rolando morreu. A noite fomos ao velório.
Eu estava muito incomodada porque via o espírito do homem andando de um lado para o outro enquanto seu corpo estava no caixão sobre a mesa.
Piorava quando ele tocava meu ombro pedindo alguma coisa que eu não entendia o que era.
Pedi a Florisa para ir embora, ela disse para eu ir sozinha porque não iria deixar o Rolando. O morto era compadre além de amigo.
Despedi-me e fui saindo pela porta (a casa da Florisa era bem pertinho), quando vi que o morto estava me acompanhando. Eu parava ele parava, eu andava ele também. Voltei ao velório na esperança que ele ficasse ao lado da viúva e me deixasse em paz.
Quando o Rolando me viu de volta, perguntou o que acontecera, eu disse que estava com medo de ir embora.
O Rolando pediu a Florisa que fosse comigo, o que deixou ela muito brava, estava gostando de conversar com as mulheres e disse que eu estava de manha.
Ficamos lá mais um tempo e o morto não saia mais do meu lado onde eu ia ele ia também.
Dei graças a Deus quando ela resolveu ir embora comigo, mesmo reclamando.
Como nada acontecia de interessante na cidade, quando tinha um enterro parecia uma festa na casa do morto, já que os velórios eram feitos em casa.
O defunto era colocado num caixão sobre a mesa e as portas e janelas cobertas com tecido roxo, café com pão era servido a vontade e a noite toda. Até garrafas de bebida circulavam pelo ambiente.
Quando chegamos em casa, eu, a Florisa e o morto, ele me tocou mais uma vez com sua mão gelada e eu comecei a chorar.
Depois de insistir para saber porque eu não parava de chorar e eu apenas dizer que estava com medo, a Florisa perdeu a paciência comigo e disse:
– Não sei mais o que fazer. Estou com minha consciência tranqüila e como não para com esta choradeira vamos rezar o terço.
Eu deitada na cama, ela sentada numa cadeira ao lado e o morto em pé olhando para mim. Foi assim que rezamos o terço até eu pegar no sono…
|